INCONTÁVEIS LINHAS E HISTÓRIAS BRASILEIRAS NA FEIRA DO LIVRO DE BOLONHA DE 2014
Fonte : Sociedade Dos Ilustradores Brasileiros
Odilon Moraes, Rosinha, Marilda Castanha e Ziraldo no café de recepção oferecido aos autores brasileiros.
Mesa com Angela-Lago, Eva Furnari e Elizabeth Serra, secretária-geral da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil.
A cidade de Bolonha sedia o mais tradicional e emblemático evento sobre livros para crianças e jovens no panorama internacional. A grande vedete da feira, diga-se de passagem, é a ilustração. Calcula-se então o que significa o Prêmio Hans Christian Andersen de ilustração para um brasileiro e primeiro candidato latino-americano a vencer nessa categoria. O Brasil já detinha dois prêmios HCA, concedidos às escritoras Lygia Bojunga (1984) e Ana Maria Machado (2000). Conquistamos novamente evidência no cenário da literatura infantil e juvenil, muito bem representados pelo carisma do escritor e ilustrador Roger Mello, merecedor do prêmio que costuma ser comparado ao Nobel do gênero. Um conquista que tampouco restringe-se à sua dedicação, talento e sensibilidade com relação às expressões profundas dos muitos Brasis que nos compõem. É um prêmio para ser compartilhado e saboreado por todos protagonistas literários brasileiros: ilustradores, escritores, designers, editores, mediadores, fomentadores e demais parceiros de traços, letras e linhas. E pelos leitores, é claro!
Público comparece e prestigia a mesa que reúne vários autores brasileiros.
Pelas nossas incontáveis linhas e histórias, entre tradições e contradições, fomos homenageados duas vezes na Feira do Livro Bolonha (1995 e 2014) e na Feira do Livro de Frankfurt (1994 e 2013). Também em março deste ano, a literatura brasileira esteve no centro das atenções da Feira do Livro de Caracas. No ano retrasado o Brasil foi o país tema da Feira do Livro de Bogotá. E será o convidado, em 2015, do Salão do Livro de Paris. Em seguida, respectivamente em 2016 e 2017, receberá novas homenagens nas Feiras de Londres e Nova York. Tal trajetória supreendente apenas os desavisados. É a força de nossa poesia e especialmente a consistência crescente da produção de livros ilustrados no Brasil que a justificam e a sustentam.
No âmbito da literatura infantil estão as mais ousadas experimentações com textos, ilustrações e design editorial. A despeito da quantidade de títulos, muito maior que o estreito gargalo do mercado, são muitas as publicações inventivas que fazem do livro contemporâneo um objeto de arte absolutamente instigante e encantador para todo e qualquer leitor habilitado. Do ponto de vista econômico, a literatura infantil dá as cartas. E é, acima de tudo, um alicerce para o desenvolvimento do espírito crítico de leitores jovens, capaz de aparelhá-los para os desafios da leitura, do conhecimento e da própria vida. Fazer arte e literatura para crianças é construir um futuro, que contrasta com um certo Brasil de desejos imediatos e antigos cacoetes. Os autores e editores brasileiros têm feito a sua parte. Esperamos mais compromisso e engajamento de nossas instituições como contrapartida de nosso esforço, assim como tem feito a FNLIJ – Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil que, há cerca de quarenta anos como seção brasileira do IBBY – International Board on Books for Young People, tem se dedicado ao fomento da leitura no Brasil e, desde 1974, à organização da participação brasileira na Feira do Livro de Bolonha.
Se o Brasil é um país de muitas vozes, como sublinhou o slogan na Feira de Frankfurt, é preciso que todas sejam ouvidas. A participação brasileira em Bolonha contou com a adesão praticamente espontânea e entusiasmada de aproximadamente 150 apaixonados brasileiros. A grande maioria dos participantes, é preciso dizer, viajou por conta própria. Foram 18 milhões de reais destinados pelo governo brasileiro para custear a Feira de Frankfurt. Para Bolonha, entretanto, foi preciso buscar recursos privados. Se fizemos uma linda festa, se marcamos presença, se voltamos ao país coroados pelo êxito e reconhecimento internacional – ou se também falhamos aqui ou acolá – isso se deve ao empenho e resistência de cada organizador: Elizabeth Serra, Lucilia Soares, Elisa Tauáçurê e equipe de produção da FNLIJ; Verônica Lessa, da BN; Moema Cavalcante e a designer Silvia Negreiros; os consultores Graça Lima, Odilon Moraes, Fernando Vilela, Roger Mello e Mariana Massarani; Heloísa e Sergio, da Arcos arquitetura; entre outros mais que arregaçaram as suas mangas e enfrentaram com coragem os obstáculos, assim como têm feito os escritores, ilustradores, designers, revisores e outros profissionais do livro brasileiros. Teremos novos eventos e homenagens internacionais pela frente. Que a história seja outra e ainda melhor.
Na mesa de abertura: Fernando Vilela, Odilon Moraes, Roger Mello, Ziraldo, Graça Lima e Elizabeth Serra, da FNLIJ.
Seja como for, no visgo do improviso, marcamos presença. Editou-se um bonito catálogo da mostra expositiva com 152 páginas, com três ilustrações de cada artista participante e uma biografia. Outros dois catálogos também circularam. Foi um marco e uma festa inesquecíveis. Nossa singularidade maior é, sem dúvida, a pluralidade. Há muito que poderia ser dito sobre nossa presença em Bolonha. Exibimos uma bela mostra de ilustrações, montada com garra, suor e suíngue. As críticas públicas à exposição feitas por Ziraldo causaram um certo desconforto. O mestre, homenageado na mostra paralela sobre sua obra, esteve presente na mesa de abertura da participação brasileira e foi também ufanista quando se pronunciou. Fez um avesso do polêmico discurso do escritor Luiz Ruffato, em Frankfurt. Da mesa seguinte sobre literatura nativa, ao lado de Ciça Fittipaldi e Mauricio Negro, o escritor Daniel Munduruku fez o contraponto: “É isso. O Brasil é mesmo plural. O Brasil do Ziraldo não é meu Brasil. No Brasil onde vivo o poder público, por exemplo, não respeita o direitos dos povos indígenas.”
Jô Oliveira, Rui de Oliveira, Daniel Munduruku e Mauricio Negro no estande do Istituto Callis Italia.
Frente à uniformidade relativa da produção alheia, fica ainda mas evidente a polifonia brasileira. Nesse sentido, as divergências também nos fazem convergir. A mostra e os catálogos lançados dão conta da diversidade, agrupada em grupos de afinidades. Há ilustrações mais vinculadas ao humor gráfico, outras com um viés europeu e erudito, imagens que se apropriam da gramática pop e universal, outras que bebem nas fontes espontâneas, étnicas e tradicionais, obras com a sintaxe dos quadrinhos, entre outras vertentes. São nossos muitos os Brasis, ou naturais, como se referia o Padre Vieira aos povos nativos.
Não houve um, mas vários encontros de confraternização. E desencontros também, que é para manter o princípio e alimentar a troca de figurinhas, lembranças e pontos de vista. Seja como for, é comovente constatar onde chegamos e sobre o que ainda nos reserva o futuro. Celebramos Roger Mello e o Brasil, torcemos pela Editora Pallas (que concorreu ao BOP – Bologna Prize – de melhor editora), conferimos a bela exposição de ilustrações, acompanhamos as mesas de convidados e boa parte dos eventos paralelos – como a mostraRadici del Brasile. Indigeni e Africani e a mostra de ilustrações SPORT no Museo Civico Archeologico de Bologna (com a participação de Eloar Guazzelli, com ilustrações do livro Futebolíada), entre outros – e também nos solidarizamos com um querido autor brasileiro, furtado na saída da feira. À brasileira, a vida também imita a arte.
Nelson Cruz aprecia a mostra de ilustração brasileira. Foto de Pétula Ventura Lemos Petersen.
A SIB – Sociedade dos Ilustradores do Brasil também foi representada por Mauricio Negro, que fez apontamentos, tirou fotos, conversou com editores brasileiros e estrangeiros e distribuiu exemplares do catálogo bilíngueIlustradores SIB: Literatura Infantil e Juvenil. Para ler mais sobre Roger Mello, sobre sua premiação e impressões, sugerimos o site da jornalista Cristiane Rogerio: Esconderijos do Tempo. Não deixe de conferir o momento do anúncio do Prêmio Hans Christian Andersen 2014 na categoria ilustração.
Graça Lima e André Neves.
Vitrine exibe obras premiadas na Feira de Livros de Bolonha de 2014.
Atentos à discussão, Odilon Moraes, Claudia Furnari e Fernando Vilela.
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