SOBRE FORMIGAS E ELEFANTES
Sobre formigas e elefantes
Há muitas fábulas que falam da
luta entre grandes e pequenos. Normalmente são narrativas que procuram oferecer
como moral da história que os pequenos podem resistir diante da pressão dos
grandes e, finalmente, vencê-los.
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Fazemos nossa dança porque nos sentimos parte da grande teia da vida. |
sta do monstro para por fim a uma tragédia anunciada. Estava tudo caminhando para um desfecho desfavorável ao povo israelita que estava acuado diante da grandiosidade do guerreiro filisteu (a narrativa bíblica fala que o moço tinha dois metros e noventa e seis centímetros de altura). Tudo parecia perdido até que se apresentou o destemido Davi que enfrentou e destruiu o gigante com um único e certeiro golpe. A arrogância dos filisteu acabou sendo massacrada por um minúsculo israelita que tinha a fé como arma.
Nas fábulas tradicionais aparecem
outras figuras que nos reportam para um tipo desfecho muito semelhante. Quase sempre
tratam-se de uma disputa desigual que é
resolvida graças ao tipo de relação que se estabelece, pois o grande aparece
como um ser arrogante que pretende usar sua força e proporção contra o que
considera frágil. Surpreendentemente, as narrativas trazem sempre a vitória do
frágil sobre o arrogante principalmente para nos lembrar que quem quer tudo,
quase nada consegue.
Outras narrativas nos trazem como
personagens seres da natureza que também têm a marca da fragilidade disputando
contra os que se consideram maiores e mais fortes. Nessas fábulas, o que está
sendo apresentado é uma solução para a resolução do conflito presente em todas
as sociedades: a sagacidade contra a força. Nessas histórias nem sempre ser
mais forte ou maior é sinal de poder. A sagacidade, a esperteza, a criatividade
e o espírito coletivo podem ser usado contra a arrogância de quem se sente
forte e poderoso. É assim a eterna disputa entre o lento jabuti e a sagaz
lebre, entre outros exemplos.
Enquanto o governo brasileiro tenta exterminar os indígenas, os indígenas tentam educar o povo brasileiro |
O Brasil inteiro está acompanhando
as notícias que têm pautado os meios de comunicação social: conflitos latentes
nos canteiros de obras de Belo Monte; invasão de território tradicional dos Terena
(invasão que tem o simbólico nome de reintegração de posse ainda que se saiba
que o território em questão não é de quem se diz ser) que culminou na morte de
um membro desse povo. É notório que se trata de uma estratégia engendrada por
setores ruralistas e pecuaristas aproveitando a mão fraca do governo brasileiro
que está criando uma situação vexatória para si mesmo e mostrando sua total
incompetência para solucionar a questão ou, se preferirem, aceitando que é um
governo radicalmente antiindígena.
O discurso usado é o de sempre. Nem
vale a pena ficar repetindo aqui. Lembro apenas que o gigante Golias gritava em
alto e bom tom palavras aviltantes para provocar a reação dos amedrontados
israelitas que pensavam não poder vencê-lo. Eram palavras que desqualificavam
seus inimigos. Com isso desejava desencorajá-los ou, ao contrário, “dar moral”
para seu exército. É assim que agem os covardes, os medrosos, os corruptos, os
imbecis, os mentecaptos de plantão. Pensam que ao desqualificar o exército
inimigo por possuir melhores armas (nesse caso, o dinheiro ou a ideia de
trabalho produtivo) se sentem vitoriosos. É, provavelmente, assim que se sente
um elefante diante de uma formiga. Acha que não fará diferença ser mordido por
uma única formiga e nada sentirá. Pura ilusão, eu penso.
O que posso tirar de conclusão de
tudo o que está acontecendo é que os indígenas estão certos em reagir contra a construção
de qualquer coisa que afete seu território tradicional. Estão certos em criar
barreiras, fechar estradas, invadir locais públicos, fazer barulho diante do congresso
nacional. Estão certos em fazer barricadas, gritar protestos, enfezar os
aliados do (des)governo brasileiro. Digo sem receio de errar: fazem isso sem
estratégia definida. Fazem por pura explosão ancestral. Não estão sob a tutela
de ONGS ou sob a liderança de ninguém a não ser das vozes dos antepassados que
lhes chega aos ouvidos repetindo a fábula do pequeno que vence o grande. Não pela
alegria da vitória, mas pela honra que devem aos antigos, pela dignidade do
pertencimento à sua memória ancestral. Isso o gigante não possui. O gigante só
sabe olhar o espelho e a única coisa que vê é a si mesmo. Quando isso acontece
vem a derrocada. O certo é sempre resistir.
Uma conversa com os brasileirinhos enquanto o governo brasileiro admite assassinar os brasileiros mais antigos. Vai entender!! |
Penso, também, que o povo
brasileiro tem que acordar do seu berço esplêndido onde continua deitado. Precisa
sair da frente da televisão e voltar às ruas para pressionar seu governo a
cumprir o que a lei maior determina: direito dos povos indígenas ao seu
território tradicional; direito à dignidade; direito à vida. Fazendo isso,
estará garantindo sua própria sobrevivência futura. Os povos indígenas não
lutam por si, lutam por ti Brasil.
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