Pular para o conteúdo principal

TÁ NA PAUTA II: DUAS FEIRAS LITERÁRIAS


ÁGUA NOVA – RIO GRANDE DO NORTE
Esta semana que finda passei por mais dois lugares participando de feiras literárias.
Crianças apresentam acróstico de Daniel Munduruku
A primeira foi em Água Nova, no sertão do Rio Grande do Norte. Para chegar lá aterrissei antes na bela Juazeiro do Norte, no Ceará. De lá segui de automóvel por três horas admirando a surpreendente paisagem sertaneja que se descortinava à minha frente enquanto ouvia um pout pourri de músicas regionais orquestrada pelo simpático e agora querido amigo Calixto.
Para chegar à pequena cidade encravada no coração do sertão passamos ainda por um pequeno trecho da Paraíba, próximo à cidade de Sousas, lugar onde já estive participando de um evento do Ministério da Cultura tempos atrás.
Água Nova é uma pequena e simpática cidade de não mais de três mil habitantes, segundo meu guia turístico e motorista. Como em muitas cidades brasileiras, nasceu a partir das paradas de boiadeiros que, segundo consta, ali permaneciam por conta da qualidade da água que jorrava de uma fonte local. Assim nasceu o povoado que se emancipou há cinquenta anos atrás e agora vive de comércio e agricultura.
Palestra 
Apesar de ser uma cidade pequena e encravada no coração do sertão nordestino – o que poderia torna-la “apenas” mais uma cidade que reclama da sorte – Água Nova acolhe gente de valor; gente que acredita em gente; gente que não está disposta a aceitar um destino sem lutar. Lá tem gente que acredita na literatura como instrumento de transformação e que quer ver as crianças e jovens bem preparados para um mundo em transformação. E foi isso que encontrei por lá: gente acolhedora, gente batalhadora, gente que faz, que cria caminhos e alimenta sonhos.
Palestra em Água Nova
Em Água Nova participei da II Feira Literária organizada por pessoas físicas, apoiada por algumas pessoas jurídicas. Pouco recurso, muita alegria. Pouca infraestrutura, muita descontração. Pouca gente? Não. Muita gente. Um público acolhedor, participativo, informado. Show de bola, como se diz. Tudo aconteceu no pátio de uma escola pública por não possuir infraestrutura para acolher um público maior. Deu certo.
Confesso minha boa impressão. Confesso meu abestalhamento pela organização e pela programação muito bem montada e conduzida com atrações que mostravam bem a cara nordestina e também o desejo de tornar a literatura como um caminho. Um bom caminho. Além de tudo isso ainda fiz novas e lindas amizades como as dos cordelistas Antonio Francisco e Arievaldo Vianna, grandes recitadores e contadores de causos; o mineiro radicado em Natal José de Castro, professor universitário e escritor.
Felicito Sédima França e Qeutre Bezerra. Felicito a cidade pela iniciativa. No final, quem ganhou fui eu.

VI A MÃO – RIO GRANDE DO SUL
Igreja Matriz
De Água Nova fui direto à Porto Alegre. Parei antes em Guarulhos para trocar de mala. Apenas parada técnica, como se diz no jargão esportivo. Isso porque a cidade de Viamão me aguardava para participar da 10ª Feira Literária da cidade. Outra realidade geográfica, outro público, outra cidade, dois extremos. Podia até soar um juízo de valor, mas confesso que em uma e outra as coisas aconteceram realmente de modo diferente. Não dá para comparar sem emitir juízo de valor por isso não farei nenhuma comparação para não parecer parcial.
Centro de Tradições
Visão geral da feira
Viamão é uma cidade relativamente próxima de Porto Alegre sendo possível, inclusive, hospedar-se na grande cidade e seguir de carro para lá. Foi o que aconteceu. Os convidados ficaram alojados na capital e se movimentavam para o evento que acontecia na praça central. Ali foram erguidas as tendas para receber o público das escolas municipais que se organizaram para assistir as apresentações culturais e palestras que aconteciam na praça  e no salão paroquial da igreja matriz. Tudo b em organizado, como deve ser.
Palestra no salão paroquial
Salão Paroquial
Ali fiz duas falas. A primeira para um grupo de crianças no espaço montado na praça. Havia alguma dispersão e o público não foi tão intenso na participação. Dei meu recado. A tarde, no salão paroquial, fiz outra roda de conversa. Essa foi mais interessante e interativa. O bom grupo de crianças participou intensamente. Muito bom.
Gostei de participar também desse momento literário. Revi amigos escritores, conheci pessoas interessantes e também refleti sobre o grande trabalho que ainda temos que fazer no sentido de conscientizar o magistério sobre a temática indígena. Muita coisa precisa ser feita.
Visão geral dos estandes
Casa Açoreana
Por curiosidade quis saber por que a cidade tem este nome. A resposta que me deram as duas pessoas para quem perguntei foi a mesma: do alto do morro em que a cidade foi fundada, vê os cinco formadores do rio Guaíba. De lá vê-se os rios em forma de mão. De lá se gritava: vi a mão, vi a mão. Era um boa notícia.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A FORÇA DE UM APELIDO

A força de um apelido [Daniel Munduruku] O menino chegou à escola da cidade grande um pouco desajeitado. Vinha da zona rural e trazia em seu rosto a marca de sua gente da floresta. Vestia um uniforme que parecia um pouco apertado para seu corpanzil protuberante. Não estava nada confortável naquela roupa com a qual parecia não ter nenhuma intimidade. A escola era para ele algo estranho que ele tinha ouvido apenas falar. Havia sido obrigado a ir e ainda que argumentasse que não queria estudar, seus pais o convenceram dizendo que seria bom para ele. Acreditou nas palavras dos pais e se deixou levar pela certeza de dias melhores. Dias melhores virão, ele ouvira dizer muitas vezes. Ele duvidava disso. Teria que enfrentar o desafio de ir para a escola ainda que preferisse ficar em sua aldeia correndo, brincando, subindo nas árvores, coletando frutas ou plantando mandioca. O que ele poderia aprender ali? Os dias que antecederam o primeiro dia de aula foram os mais difíceis. Sobre s...

MINHA VÓ FOI PEGA A LAÇO

MINHA VÓ FOI PEGA A LAÇO Pode parecer estranho, mas já ouvi tantas vezes esta afirmação que já até me acostumei a ela. Em quase todos os lugares onde chego alguém vem logo afirmando isso. É como uma senha para se aproximar de mim ou tentar criar um elo de comunicação comigo. Quase sempre fico sem ter o que dizer à pessoa que chega dessa maneira. É que eu acho bem estranho que alguém use este recurso de forma consciente acreditando que é algo digno ter uma avó que foi pega a laço por quem quer que seja. - Você sabia que eu também tenho um pezinho na aldeia? – ele diz. - Todo brasileiro legítimo – tirando os que são filhos de pais estrangeiros que moram no Brasil – tem um pé na aldeia e outro na senzala – eu digo brincando. - Eu tenho sangue índio na minha veia porque meu pai conta que sua mãe, minha avó, era uma “bugre” legítima – ele diz tentando me causar reação. - Verdade? – ironizo para descontrair. - Ele diz que meu avô era um desbravador do sertão e que um dia topou...

HOJE ACORDEI BEIJA FLOR

(Daniel Munduruku) Hoje  vi um  beija   flor  assentado no batente de minha janela. Ele riu para mim com suas asas a mil. Pensei nas palavras de minha avó: “ Beija - flor  é bicho que liga o mundo de cá com o mundo de lá. É mensageiro das notícias dos céus. Aquele-que-tudo-pode fez deles seres ligeiros para que pudessem levar notícias para seus escolhidos. Quando a gente dorme pra sempre, acorda  beija - flor .” Foto Antonio Carlos Ferreira Banavita Achava vovó estranha quando assim falava. Parecia que não pensava direito! Mamãe diz que é por causa da idade. Vovó já está doente faz tempo. Mas eu sempre achei bonito o jeito dela contar histórias. Diz coisas bonitas, de tempos antigos. Eu gostava de ficar ouvindo. Ela sempre começava assim: “Tininha, há um mundo dentro da gente. Esse mundo sai quando a gente abre o coração”...e contava coisas que ela tinha vivido...e contava coisas de papai e mamãe...e contava coisas de  hoje ...