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Ensino superior e indígenas, uma revolução silenciosa



Flora Egécia/Cespe
OSVALDO JúNIOR 



Pelo levantamento do programa, Mato Grosso do Sul tem, hoje, 920 acadêmicos indígenas. “É um número altamente representativo se olharmos para alguns anos atrás”, avalia Brand. Em 2006, havia 312 universitários indígenas no Estado – ou seja, em seis anos, o crescimento foi de 207%.
O número de acadêmicos indígenas cresce juntamente com a consciência da importância da educação universitária na transformação da vida nas aldeias, marcada por problemas de saúde, de terra, de alimentação, de recursos materiais, de segurança, de consumo de álcool e outras drogas. “O que eu quero é trabalhar com a saúde na comunidade. Eu vejo que o branco no posto de saúde muitas vezes não tem paciência com o índio. E o índio muitas vezes não entende o que branco fala. E quando eu dou palestra todo mundo entende e gosta”, conta Dayane.
As palestras referidas pela acadêmica são realizadas na aldeia Buriti e têm como assunto principal as doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Dayane salienta que, mais que as DSTs, diabetes e obesidade acometem a comunidade – sobre essas doenças, ela também tem conversado com os indígenas.
Apesar de sua família morar na aldeia Buriti, Dayane tem o coração dividido, pois descende dos kadiwéus e já morou na comunidade de Bodoquena, que abriga essa etnia. Assim, a aldeia de Bodoquena está, igualmente, em seus planos profissionais.
Dificuldades 
Por causa da faculdade, Dayane está morando com o marido em Campo Grande. Para ela, no entanto, sua casa é na aldeia Buriti, onde vive seu filho de cinco anos, que é cuidado pela avó. Todas as sextas-feiras, ela viaja para a comunidade. “Eu não consigo ficar longe da minha família, da aldeia”, conta. O preço é relativamente alto. Segundo a estudante, o custo total das suas passagens (ida e volta) é R$ 21,60. Por mês, essa despesa representa R$ 86,40.
Mas o que pesa mesmo no bolso da acadêmica e de sua família é a faculdade. Através do programa Rede de Saberes, ela tem uma bolsa de 50%. Mesmo com esse apoio, ainda faltam R$ 420, pagos com sacrifrício.
Ao falar de suas aldeias (Buriti e Bodoquena), Dayane se mostra convicta que todo o esforço vale a pena. “Estou estudando pra trabalhar nas aldeias. Porque nós índios não aceitamos a maneira como somos tratados nos postos de saúde”. E ela não apenas espera por um tratamento humanizado, como também se prepara para ser uma das protagonistas dessa mudança. 

Correio do Estado

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