Pular para o conteúdo principal

‘Caravana Mekukradjá’ difunde literatura indígena na Amazônia

Projeto que busca divulgar a literatura produzida pelos povos indígenas promove encontro entre autores e jovens estudantes, universitários e professores de Manaus

JONY CLAY BORGES


Daniel Munduruku é um dos autores que participa da caravana (Reprodução)


Já há bastante tempo os povos indígenas do Brasil superaram as barreiras da língua e dos costumes e instituíram representantes também na literatura do País. Vários desses representantes participam da “Caravana Mekukradjá – Literatura indígena em movimento”, que chega a Manaus nesta quinta-feira (24).

A iniciativa, que busca difundir a literatura produzida pelos povos indígenas, promoverá oficinas e um sarau literário com escritores e jovens estudantes, universitários e professores de Manaus na Escola Estadual Professor Gilberto Mestrinho, em Educandos.

A programação da “Caravana Mekukradjá” começa na quinta, com duas oficinas voltadas para alunos do Ensino Fundamental (das 9h às 11h) e do Ensino Médio (das 14h às 17h).

No mesmo dia, das 19h20 às 21h30, haverá um bate-papo com universitários e professores com o objetivo de discutir a Lei 11.645/2008, que torna obrigatório o ensino da história e da cultura indígena nas escolas do País.

Na sexta-feira, dia 25, das 19h30 às 22h, será realizado um sarau literário, aberto ao público em geral, em que os escritores indígenas e o público participante terão um momento de diálogo e de descontração.

“A ideia (do sarau) é ser um momento não acadêmico. Vamos ter recitação, canto, dança, música, essa diversidade toda”, adianta o escritor Daniel Munduruku, coordenador da “Caravana Mekukradjá”.

Além dele, que também é Doutor em Educação, participam da ação Ely Macuxi, escritor, professor e assessor em Educação em Manaus; Naine Terena, radialista, produtora cultural e doutoranda em Educação; Rony Wasiri Guará, professor, poeta, artista plástico e contador de histórias; e Rosi Whaikon, escritora e mestranda em Antropologia Social.

Além da palavra
De acordo com Daniel, a iniciativa – contemplada com Bolsa de Circulação Literária pela Fundação Nacional de Arte (Funarte) – busca levar pessoas de todas as idades a vivenciar “uma literatura que não é apenas escrita, mas também vivida”.

“Mesclamos debates com oficinas para crianças e jovens. Por meio delas queremos que eles convivam com a gente, para perceber que a literatura não se resuma à parte escrita, mas a literatura dos povos indígenas é sobretudo ritual, é feita de ritos, palavras, oralidade, dança, canto”, declara o escritor.

A ideia de movimento, que marca a caravana, caracteriza a literatura produzida pelos povos indígenas, na visão de Daniel.

“Queremos mostrar uma literatura que se move, feita pelo movimento dos corpos das pessoas, dos grupos indígenas, e que eventualmente usa também a plataforma escrita”, destaca o autor.

No ensino
O escritor Ely Macuxi destaca a importância de se debater a Lei 11.645/2008, o que está na pauta do evento. “Geralmente há muita desinformação com relação às questões da cultura indígena.Procuraremos informá-los e trabalhar dando orientações visando permitir que eles transmitam um conhecimento mais real sobre a questão indígena”, destaca o autor, lembrando que a legislação que obriga a inclusão de história e cultura indígenas no currículo escolar já está em vigor.

“Todos os professores já deveriam ter recebido essa formação, mas sabemos que isso não aconteceu ainda. Por conta disso realizamos esses encontros em todo o Brasil”.

Fonte: Acrítica UOL

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A FORÇA DE UM APELIDO

A força de um apelido [Daniel Munduruku] O menino chegou à escola da cidade grande um pouco desajeitado. Vinha da zona rural e trazia em seu rosto a marca de sua gente da floresta. Vestia um uniforme que parecia um pouco apertado para seu corpanzil protuberante. Não estava nada confortável naquela roupa com a qual parecia não ter nenhuma intimidade. A escola era para ele algo estranho que ele tinha ouvido apenas falar. Havia sido obrigado a ir e ainda que argumentasse que não queria estudar, seus pais o convenceram dizendo que seria bom para ele. Acreditou nas palavras dos pais e se deixou levar pela certeza de dias melhores. Dias melhores virão, ele ouvira dizer muitas vezes. Ele duvidava disso. Teria que enfrentar o desafio de ir para a escola ainda que preferisse ficar em sua aldeia correndo, brincando, subindo nas árvores, coletando frutas ou plantando mandioca. O que ele poderia aprender ali? Os dias que antecederam o primeiro dia de aula foram os mais difíceis. Sobre s...

MINHA VÓ FOI PEGA A LAÇO

MINHA VÓ FOI PEGA A LAÇO Pode parecer estranho, mas já ouvi tantas vezes esta afirmação que já até me acostumei a ela. Em quase todos os lugares onde chego alguém vem logo afirmando isso. É como uma senha para se aproximar de mim ou tentar criar um elo de comunicação comigo. Quase sempre fico sem ter o que dizer à pessoa que chega dessa maneira. É que eu acho bem estranho que alguém use este recurso de forma consciente acreditando que é algo digno ter uma avó que foi pega a laço por quem quer que seja. - Você sabia que eu também tenho um pezinho na aldeia? – ele diz. - Todo brasileiro legítimo – tirando os que são filhos de pais estrangeiros que moram no Brasil – tem um pé na aldeia e outro na senzala – eu digo brincando. - Eu tenho sangue índio na minha veia porque meu pai conta que sua mãe, minha avó, era uma “bugre” legítima – ele diz tentando me causar reação. - Verdade? – ironizo para descontrair. - Ele diz que meu avô era um desbravador do sertão e que um dia topou...

HOJE ACORDEI BEIJA FLOR

(Daniel Munduruku) Hoje  vi um  beija   flor  assentado no batente de minha janela. Ele riu para mim com suas asas a mil. Pensei nas palavras de minha avó: “ Beija - flor  é bicho que liga o mundo de cá com o mundo de lá. É mensageiro das notícias dos céus. Aquele-que-tudo-pode fez deles seres ligeiros para que pudessem levar notícias para seus escolhidos. Quando a gente dorme pra sempre, acorda  beija - flor .” Foto Antonio Carlos Ferreira Banavita Achava vovó estranha quando assim falava. Parecia que não pensava direito! Mamãe diz que é por causa da idade. Vovó já está doente faz tempo. Mas eu sempre achei bonito o jeito dela contar histórias. Diz coisas bonitas, de tempos antigos. Eu gostava de ficar ouvindo. Ela sempre começava assim: “Tininha, há um mundo dentro da gente. Esse mundo sai quando a gente abre o coração”...e contava coisas que ela tinha vivido...e contava coisas de papai e mamãe...e contava coisas de  hoje ...